domingo, 20 de julho de 2008

O processo criativo de Leminski




Embora simples na linguagem, as idéias incrustadas nas poesias de Paulo Leminski têm um quê de rebuscamento e sofisticação. A autêntica criatividade ao expressar-se o tornou um dos mais célebres poetas brasileiros.

Curitiba, a cidade conservadora e de tradições recatadas, foi o berço descabido do poeta. Durante toda a sua existência na cidade provinciana, havia quem jurasse que Leminski caiu em solo extraterreno, mas criou raízes.

Incompreendido, ele tentava compreender e alterar o espaço urbano, rompendo qualquer tipo de regra que lhe fosse imposta. De acordo com a viúva Alice Ruiz, Paulo viveu como um exilado. Nada que não contivesse idéias e poesia o cativava.

O sentimento de não pertencimento de Paulo Leminski fez com que ele procurasse caminhos para se desvencilhar do fardo. Ele procurou se envolver não só com literatura em prosa e poesia, mas também com fotografia e música. As artes em todas as suas manifestações eram, para ele, subterfúgios para escapar da incompreensão.



De acordo com a psicóloga Neuzi Barbarini não é preciso um momento solene, excepcional, para fazer brotar a inspiração artística. Esta surge quando alguns conteúdos internos fazem sentido e tomam forma.

Segundo ela, o processo criativo intrigava o próprio Freud, que no seu texto “Escritores criativos e devaneio” se mostrou impressionado pela pouca ou nenhuma distância existente entre o artista e o homem comum, a não ser uma tendência do primeiro em, como as crianças, “brincar” com seu objeto de criação, que são as palavras, conseguindo com isso criar imagens impressionantes que, escritas sem arte, poderiam nos chocar ou causar repulsa.



Neuzi considera Leminski um brincante. Para ela o haicai (forma muito comum no trabalho do artista) era malabarismo com palavras, que se equilibravam precariamente formando sentidos tão inusitados quanto os das bolas que voam no ar parecendo um círculo sem sê-lo.

Se referindo à arte de Leminski e resgatando Freud, Neuzi coloca ainda que a arte é inútil, pois só na inutilidade ela pode cumprir sua função transgressora, transformadora e “libertadora de tensões”. Segundo ela o útil não é arte, é mercadoria que se consome até fartar, já a arte sempre reserva uma emoção nova quando tudo parece já conhecido.

A estudiosa portuguesa Judite Cruz (1999), afirma que em termos psicológicos todo processo artístico parte de um relativo caos. Para ela são as metáforas, analogias, imagens, narrativas e exemplos físicos que ajudam a criar ordem no pensamento. Leminski sempre partiu do caos para mais tarde sentir ser-no-mundo.


Afonso Lisboa da Foncesa, em seus estudos da psicologia, diz que a existência afirmativa da arte é assumida como afetividade do vivido. Ou seja, o processo artístico, em toda a sua plenitude, é inerente ao processo e incerteza próprios do ser humano.

Sendo assim, Paulo talvez tivesse considerado a existência da arte como criação e produção de vida, de força de vida, e do mundo. O processo criativo para ele parece ter sido uma vivência organísmica.

Ainda lembro...

"Paulo Leminski a quem não interessava nada que não contivesse idéias e poesia, viveu nessa vida como um exilado."

Alice Ruiz, esposa.

"Como pai o Paulo não era nada tradicional. Ele preferia me levar passear nos campos do intelecto e da história. Por exemplo, quando lhe perguntei o que era a revolução russa e ele parou tudo que estava fazendo para me explicar, dar uma aula detalhada, com paixão e precisão. Não satisfeito, escreveu um livro, a biografia de Trotsky e, generosamente, dedicou a mim. A partir deste momento eu soube qual era o caminho para o seu coração: o mundo das idéias, do pensamento, da criação, da palavra."

Aurea Leminski, filha.

"Ele me fascinou e fascinaria em qualquer época pois era uma pessoa fora do comum, extrovertido, sempre alegre."

Neiva Maria de Souza, desenhista e ex-mulher.

"Em 1983, eu fiz uma exposição na sala da Funarte, em Curitiba, chamada Nuvimento. Como eram trabalhos centrados na figura da mulher eu pedi a Alice que fizesse um poema para apresentar a mostra. Quando soube, o Paulo veio conversar comigo e pedir satisfações. Queria saber por que eu não tinha pedido um texto para ele. Estava com ciúmes."

Nego Miranda, fotógrafo.

"Convivemos muito. Ele era uma pessoa generosa. Uma das lembranças mais fortes que guardo dele é de quando o Nhô Belarmino (o músico e cantor sertanejo Salvador Graciano), de quem o paulo gostava muito, morreu. Ele me procurou e perguntou se eu queria compor com ele uma canção em homenagem. Eu disse que sim e ele já mostrou o texto,lindíssimo, pronto. O Paulo não era de endeusar ninguém, muito pelo contrário, mas, por outro lado, gostava das coisas simples, e quando o Belarmino morreu ele ficou visivelmente emocionado, tocado mesmo."

Marinho Galera, músico e parceiro.

"O Leminski por trás de toda a fleuma de intelectual polêmico, era um sujeito dócil e muito engraçado."

Jaime Lechinski, jornalista.

Fonte: http://www.leminski.curitiba.pr.gov.br/

*Texto de autoria de Juju Fontoura publicado na primeira edição da revista autoral "Releitura" produzida em junho, como prática pedagógica do programa de aprendizagem Produção Editorial em Revista do curso de Comunicação Social - Jornalismo da PUCPR.

Orientação: Prof.ªMaria Teresa Freire.

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